Certificação do Pão-de-ló
divide fabricantes de Ovar
A certificação do pão-de-ló de Ovar, bolo húmido e fofo, que terá nascido em 1700 num convento que existia nas imediações da cidade, é um objectivo que mora há já algum tempo nos paços do concelho. Depois de algumas diligências sem resultados práticos, a câmara janta esta noite com a maioria das cerca de três dezenas de fabricantes do doce emblemático e exclusivo, confeccionado com ovos, açúcar e farinha de trigo.
A vereadora da Cultura, Conceição Vasconcelos, explica qual a intenção do encontro: "A certificação é importante para que haja a valorização e diferenciação do produto. Para que não ande todo o mundo a fazer o pão-de-ló sem respeitar as regras". A Câmara de Ovar pretende, desta forma, iniciar o processo. Nesse sentido, falou com entendidos na matéria, ou seja, a Associação Produtora de Ovos-Moles de Aveiro (APOMA) e que hoje estará presente no encontro para dar o seu testemunho, para saber o que fazer.
Conceição Vasconcelos acredita que grande parte dos produtores do pão-de-ló está sensibilizada para o assunto. "Ninguém revelará segredo nenhum. Será feito um caderno de especificações do produto e os fabricantes terão de obedecer a determinados critérios", refere.
"Não quero vender em grandes superfícies"
Luís Duarte é o mais antigo fabricante do pão-de-ló de Ovar. A receita anda na família desde 1800. "Tenho a patente registada, clientes específicos e não quero vender em grandes superfícies", garante. A certificação do doce que patenteou em 1950 não faz parte dos seus planos. E há uma razão para isso, com documentos à mistura. O produtor recorda que, há sensivelmente 10 anos, pediu a certificação do doce vareiro ao ministério respectivo. "Disseram-me para retirar o pedido e enumeraram os inconvenientes", lembra. Foi o que fez. O principal inconveniente apontado, e que até hoje Luís Duarte tem em consideração, foi de que a receita tinha de ser dada com todos os pormenores e, desta forma, os ingredientes e a própria confecção se tornariam públicos na Europa. "Dessa forma, a União Europeia podia fazer o pão-de-ló de Ovar", concretiza.
O fabricante defende que o doce típico deve ser vendido apenas na cidade de Ovar. "Se quiser comer leitão, com as suas características, vou à Bairrada", compara. Luís Duarte tem sérias dúvidas de que a certificação possa travar a proliferação de cópias do doce típico de Ovar em vários locais, como nas lojas de conveniência dos postos de abastecimento de combustível. "Publicita-se a venda do pão-de-ló nas janelas e portas, de produtos fabricados em garagens", lamenta. "A minha posição será esta até que me demonstrem o contrário", confessa.
Diferente é a posição de Alda Almeida, que fabrica pão-de-ló há seis anos e está a favor da certificação. "Traz vantagens a quem vende e principalmente a quem compra". Na sua opinião, é essencial "garantir a qualidade do produto": "Certificada a receita, temos de a respeitar", acrescenta. A fabricante desconfia do pão-de-ló que é vendido em confeitarias do Porto e tem dúvidas sobre o doce que encontra nas prateleiras dos hipermercados. Nesse sentido, a certificação tem as suas vantagens. Põe um travão "às pessoas que vendem e não pagam os seus impostos e ajuda os comerciantes de porta aberta".
"As cópias não são bem digeridas"
Paulo Paciência entende que é importante garantir as características e a genuinidade do pão-de-ló de Ovar. "É importante garantir a qualidade do produto e não deixar fugir as características que tão bom nome lhe deram", defende o fabricante, que comercializa o pão-de-ló há oito anos. E se o processo avançar, o produtor acredita que o doce não será visto "com tanta facilidade" fora de Ovar. "As cópias não são bem digeridas. Há gente que fica com uma má impressão e, se calhar, nunca chegou a provar o verdadeiro pão-de-ló", aponta. («Público»)
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