quarta-feira, fevereiro 15, 2006

Martinho da Vila: Duas noites em Ovar

Entrevista com Martinho da Vila
«Cantando a vida em tom maior»

«A avó da minha ex-mulher adorava Martinho da Vila. Dizia: “Esse cantor me faz tanto bem! Ele está sempre sorrindo”! E Martinho – como lerão nesta entrevista – realmente é assim: um sorriso nos lábios, manemolência no corpo e batuque na alma. Mantém diante de um mundo partido o alto astral. Quando armam confusão ou pagode faz a tristeza sambar no jogo do jongo. Ele sabe que na folia os esperançosos são reis. Como diz Heloneida logo abaixo, ele tem o dom da alegria. Não o júbilo oco da gargalhada incontida, mas um+a animação militante que usa o ritmo e o riso denunciando mazelas para transformá-las em bem-querer. A primeira palavra do seu primeiro grande sucesso nacional é “felicidade”, embora a música decante uma situação infeliz e injusta. Devagar, devagarinho, sem gritar palavras de ordem unida, é um militante das raças, forjando laços com os africanos, tecendo sons com os latinos. Em sua fazenda-instituto roceiros aprendem a ler e em seus discos nós, os urbanos, aprendemos a ouvir os tambores do interior. Cantando alto, cantando baixo, diz que a vida vai melhorar. Ou como o saudou Poerner ao final deste papo: “Enfim, um otimista”! Um papo onde entraram na roda Ziraldo, Arthur Poerner, Paula Sack e eu (da equipe do Caderno B) e puxando o samba a deputada e feminista Heloneida Studart e o teatrólogo e boêmio Nelsinho Rodrigues Filho. (Ricky Goodwin)

Arthur Poerner - Martinho, eu te conheci em circunstâncias interessantes. Nas rodas de samba do Teatro Opinião, em 1966, apareceu um sujeito muito simpático cantando suas músicas, todo mundo gostou dele, mas aí alguém descobriu que ele era sargento. Tinha havido o golpe há dois anos e todo mundo era bronqueado com os militares.

Martinho da Vila - Teresa Aragão promovia umas rodas de samba no Opinião chamadas A Fina Flor do Samba. Era o único ponto de samba em toda a Zona Sul. O público ali era esquerdista, comunista, pessoal do partidão. Quando descobriram que eu era sargento, ficou aquele zum-zum-zum...

Poerner - Acabou que conversando com Martinho, tivemos que reavaliar alguns de nossos conceitos sobre as Forças Armadas.

Martinho - Mas os sargentos eram considerados de esquerda dentro do Exército. De uma maneira geral, tinham sido janguistas.

Heloneida Studart - Um dos pretextos para derrubarem o Jango era que ele privilegiava muito os sargentos e os subtenentes, inclusive aumentando seu soldo, quebrando assim a hierarquia.

Martinho - O pessoal da Zona Sul desconfiava de mim porque eu era militar, e no Exército me consideravam um comunista, por causa dos amigos com quem eu andava. Quando terminei o curso de Aperfeiçoamento de Sargento, em 64, me formei como contador, mas o diploma não tinha validade fora do Exército e fui fazer Contabilidade na Cândido Mendes, um ponto da esquerda. Aí descobriram lá que eu era sargento e todo mundo se afastou de mim... porque tinha muita gente do Exército infiltrada mesmo nas universidades. Sabem o que eu fiz para resolver isso: um dia fui fardado na sala de aula. Foi um espanto! (ri)

Poerner - Ficou evidente que você não era do SNI, senão não apareceria fardado.
Dermeval Netto - Como era a música que você ouvia na zona rural fluminense, onde cresceu?

Martinho - Nasci em Duas Barras, depois de Friburgo. Era jongo, folia de reis... Duas Barras é próximo a Minas e ouvi muita música mineira de interior. Mas com quatro anos de idade vim pro Rio. Só voltei a Duas Barras depois que fiquei famoso. Todo mundo pensava que eu era baiano, por ter surgido na mesma época que Gil e Caetano, e também pelo meu jeito baiano. (ri)

Ziraldo - Manemolente... devagar, devagarinho...

Martinho - Naquela época eu falava menos ainda... Rapaz, quando revelei que tinha nascido em Duas Barras foi um acontecimento na cidade! Me convidaram para ir lá, hospedaram toda a minha família, programaram uma festa com banda de música e tudo. Me levaram para a igreja onde fui batizado, para o cartório onde fui registrado, e para a casa onde nasci, porque meus pais era colonos da terra, muito queridos pelos patrões, e quando eu estava para nascer trouxeram minha mãe para a sede da fazenda. Quando cheguei lá essa fazenda estava à venda e eu comprei! Anos depois criei lá um instituto cultural para alfabetização de adultos e o ensino de música voltada ao folclore.

Ziraldo - De onde vem essa consciência participativa? Você é um dos artistas brasileiros mais comprometidos com a questão do seu semelhante.
Martinho - Fui adquirindo isso com o tempo. Primeiro foi através do Salgueiro, que na época era uma escola de samba engajada. Quando Fernando Pamplona e companhia fizeram o enredo Zumbi dos Palmares, ninguém conhecia Zumbi no Brasil. Depois, em 69, fui convidado para ir a Angola, que ainda era colônia. Aqui não se tinha notícia do que se passava na África, era como se tudo fosse uma grande floresta onde se aprisionavam escravos.

Ziraldo - O próprio Lula agora se espantou com as cidades africanas: ''É tudo arrumadinho! As ruas são asfaltadas! Nem parece a África''.

Heloneida - Você conheceu os líderes guerrilheiros de Angola, como Agostinho Neto?

Martinho - Agostinho estava combatendo na floresta, mas conheci muitas pessoas que hoje são dirigentes do país. A gente se reunia num clube chamado Marítimo Africano para cantar e festejar. Aí, começaram a me levar nas favelas, mas os portugueses que me contrataram - que eram do lado contrário - não queriam me deixar ir. Em Angola fui tomando mais noção das coisas. Hoje, os angolanos me consideram uma pessoa que faz parte do seu processo de libertação.

Dermeval - E você se transformou numa espécie de embaixador informal de Angola no Brasil.

Martinho - Tenho esse título honorário. Como não havia embaixada aqui, sempre que vinha um dirigente ou empresário eu é que o recebia.

Ziraldo - Quantas vezes você voltou a Angola?

Martinho - Muitas vezes. Vim de lá ontem. (risos)

Ziraldo - Mas vamos voltar à sua história. Você saiu de Duas Barras e veio morar onde no Rio?

Martinho - Na Serra dos Pretos Forros, Boca do Mato. Depois de Vila Isabel, depois de Lins de Vasconcelos. O cara que vinha se aventurar no Rio arrumava emprego nas construções e ia morar nas favelas junto com seu núcleo de origem. No morro carioca onde eu morava tinha um núcleo mineiro e um núcleo nordestino e tomei contato com todas essas culturas.

Ziraldo - Quando você sentiu que seria capaz de fazer um samba?
Martinho - Antigamente tinha muito campo de pelada e no meu morro tinha três times bons. Eu jogava no Boca do Mato. Quando a gente ia jogar em outro lugar, ia de caminhão, com uma torcida, e eu pra animar o pessoal no caminho pegava músicas de sucesso e botava letra falando do time. O pessoal me perguntava: ''E aí, qual é a nova?'' Depois passei a criar músicas minhas para o Boca do Mato. Aí surgiu uma escola de samba lá.

Ziraldo - Martinho, por que você virou da Vila se é da Boca do Mato?

Martinho - Me chamo Martinho José Ferreira. Quando fui gravar meu primeiro disco, em 69, tinha um partido alto chamado Quem é do mar não enjoa: (canta) ''Quem quiser saber meu nome / não precisa perguntar / sou Martinho lá da Vila / partideiro devagar''. Aí puseram esse nome no disco. (ri)

Ziraldo - Esse disco é o que tem... (canta) ''Felicidade / passei no vestibular''?

Martinho - Pequeno-burguês. Foi um disco que fez o maior sucesso. A principal faixa era Casa de Bamba: (canta) ''Na minha casa todo mundo é bamba / todo mundo bebe, todo mundo samba''. Até hoje foi o disco que mais vendeu na minha carreira.

Ricky Goodwin - O interessante do sucesso do Martinho com esse disco foi ele ter emplacado inclusive no meio dos intelectuais, em plena tropicália, quando o samba estava fora das paradas de sucesso.

Poerner - Porque as músicas dele tinham um lado de protesto, como na música Tom maior. Canta um pedaço dessa música para a gente.

Martinho - ''Está pra nascer em você o que o amor gerou / ele vai nascer e há de ser sem dor / Ah, eu hei de ver você ninar e ele dormir / Hei de vê-lo andar, falar, sorrir / E enquanto quando ele crescer / Vai ter que ser homem de bem / Vou ensiná-lo a viver / onde ninguém é de ninguém / Vai ter que amar a liberdade / só vai cantar em tom maior / Vai ter a felicidade de ver um Brasil melhor''.

Dermeval - Mas o Martinho já tinha aparecido na mídia cantando um partido alto no festival da Record de 67: Menina moça.

Martinho - Eu mandei essa música só de onda, não sonhava em concorrer nos festivais, então nem acompanhei a classificação. Tiveram que me procurar, não me acharam, não apareci para cantar a música, porque os finalistas eram gravados antes em um disco. Tinha um conjunto muito bom que substituia os artistas que faltavam, O Quarteto. Mas eles não sabiam fazer a cadência do partido alto. Ficou outra música! Era uma canção simples, falando da insatisfação das pessoas, mas pegando uma menina moça que vai passear, depois quer namorar, depois quer casar, depois quer brigar, depois quer desquitar... E desquitar era uma palavra proibida na época! A música foi censurada! Ainda mais que depois de desquitar a menina moça quis amigar! Fizeram uma campanha de que eu era contra a instituição da família! (ri) Nesse mesmo festival, Alegria alegria'' foi censurada, disseram que era uma alusão ao LSD. Depois a Record conseguiu liberar apenas para constar no festival. Como foi premiada e fez muito sucesso não tiveram como segurar, mas a minha que não foi premiada continuou censurada. Só queriam músicas ufanistas! (ri novamente)

Ziraldo - Você foi o primeiro a trazer o partido alto para o consumo da classe média, né?


Martinho - Existiam umas coisas antes, como Clementina, mas era meio apadrinhado.
Ziraldo - O partido alto é uma coisa emocionante, né Martinho? Aquela roda de pessoas, todo mundo improvisando, passando os versos de um para outro.

Martinho - É legal, né, algo ligado à bebida, à comida e à música, e onde você participa mesmo, não é como um show onde as pessoas ficam assistindo.

Ziraldo - Como é seu processo de criação? Você cria primeiro a letra ou a melodia?

Martinho - Crio de muitas formas. Na maioria das vezes, um parceiro faz uma parte da música e eu completo. Tenho uma capacidade muito grande de musicar coisas.
Ziraldo - No texto que escrevi para a capa do seu segundo disco eu já estava impressionado com o seu toque pessoal. Tem música que toca e você logo diz: ''Isso é do Ataulfo Alves''. Ou: ''Isso é Paulinho da Viola''. Você também tem um estilo que marca.

Martinho - São pessoas que não tiveram formação musical, são intuitivos, criam músicas fora das escolas, sabe como é? Os maestros agora estão mais abertos para isso, mas antes diziam que as nossas músicas é que estavam erradas.

Dermeval - A partir de certo momento, o seu samba se volta para as raízes musicais brasileiras. Você fez um disco de cirandas, um disco com cantos de lavadeiras, entrou de cabeça no folclore.

Martinho - Isso começou com minhas viagens. O que a música me deu de melhor foi a possibilidade de viajar. Meus colegas nunca saíam da Boca do Mato, já eu gostava de pegar o bonde e ir para Copacabana. Depois comecei a andar pelo Estado do Rio. Com o sucesso, fui para Pernambuco, para o Norte do Brasil, para a África...
Ziraldo - Você já sonhava com seu destino?

Martinho - Nunca. Eu sonhava em mudar para a cidade. Tudo foi acontecendo por acaso. Tanto que só mandei música para festival porque os colegas insistiram muito. Quando a RCA me chamou para fazer um contrato, pensei que era para fazer alguma música para um grande cantor. Quando cheguei lá e disseram que queriam me contratar como cantor foi uma decepção. Nunca tinha pensado em ser cantor! Eu queria era fazer musicas. ''Ah, esse contrato eu não quero... Martinho, essa é a maior gravadora do Brasil no momento! Qualquer artista gostaria de ter essa proposta!'' Insisti tanto que propuseram um acordo: me dariam o estúdio para eu gravar um disco com minhas músicas e em seguida eu faria um disco de cantor. Gravamos um disco simples, sem nada de produtor, mas aí ele arrebentou e nunca gravei o disco de cantor!

Poerner - É extraordinário como você conseguiu criar um estilo totalmente diferente num país de excelentes cantores.

Martinho - Como eu não sonhava ser cantor, não me espelhava em ninguém, e tendo que me virar de repente saiu essa maneira de cantar. (ri)

Heloneida - Nós estamos aqui entrevistando o Martinho e ainda não falamos das mulheres na sua vida.

Ziraldo - Sou testemunha do sucesso que você fazia com as mulheres! Essa malemolência é sedutora... Uma vez uma mulher me falou: ''Homem tem que saber segurar numa mulher. O jeito dele botar a mão na cintura da mulher é fundamental''. Nessa noite fui numa festa e fiquei reparando como esse canalha desse Martinho pousava a mão direitinho nas mulheres! Você ganha do Vinicius, tem mais de nove casamentos, né?

Martinho - O que é isso, Ziraldo! São quatro casamentos só! Tenho oito filhos e nove netos! Minha primeira mulher foi Anália, mãe de Martinho Augusto, Analimar e Martinália. Depois morei com a Russa e tivemos Tunico e Juliana. Só de Russa foram 20 anos. Tive depois uma filha com a Rita, a porta-bandeira do Salgueiro, que se chama Maria e é pianista erudita. Com a Cleo casei no papel e temos dois filhos, Preto e Alegria.

Ziraldo - Ele chama Preto mesmo?

Martinho - Todo mundo achou estranho esse nome. Com a família da minha mulher, gaúchos de São Borja, todos brancos, até que não teve problema. Mas com a minha família, toda de pretos...

Nelsinho Rodrigues Filho - Você teve problemas na sua vida por ser negro?

Martinho - Eu transo com os problemas, os dissabores, as doenças, tudo de ruim que acontece, de uma maneira para cima. Eu deleto. Se me perguntarem se já fiz alguma cirurgia, conscientemente demoro para responder, tenho que dar uma pensadinha. Nem me lembro. Minha filosofia de vida é: se é ruim, esqueço. Artista tem mania de falar que sofreu. Já notou como todos passaram fome? Parece que pega bem. É provável que tive problemas de fome, saí da roça e fui morar na favela, não tinha água nem luz, era barracão de zinco, meu pai morreu quando eu tinha dez anos... mas eu não me lembro.

Ziraldo - Grande parte da humanidade aceita a vida com naturalidade. Nem imaginam que possa haver outra coisa.

Martinho - Não é isso, Ziraldo, o conformismo é outra coisa. Eu, quando a bola vem
no pé, jogo com ela, e vou para a frente. Sei que intelectualmente o otimista não é bem visto, mas é assim que eu sou. (ri)

Heloneida - Você tem é o dom da alegria.

Ziraldo - O compromisso dele com a alegria é tanto que botou esse nome na filha.

Martinho - Mas todos os grandes revolucionários foram otimistas! O pessimista não acredita que as coisas possam mudar. Minhas músicas enfocam os problemas mas sempre com uma esperança.

Ricky - Por falar em driblar os problemas, como é que você conseguiu ficar tanto tempo sem casar de fato?

Martinho - Eu não era casado, mas morava com Anália e meus filhos, era um marido e pai, só que eu morava também na casa da minha mãe. Não era uma relação de casamento comum. Com a Russa foi mais sério, mas nos últimos anos a gente estava se desentendendo. Levamos uns dez anos nos separando. Com a Rita, namorei, botei um apartamento para ela, tivemos uma filha, mas nunca casamos mesmo.

Ricky - Mas agora você levou uma prensa e teve que casar de papel passado!

Martinho - Porque Preta queria casar, tinha 16 anos e eu já com 48. Ficamos um tempo namorando mas ela falando o tempo todo em casar. Eu estou numa fase em que sempre estou me preparando para deixar a vida artística, só que as coisas vão acontecendo, aparece outro sucesso... Falei então que eu casaria se fosse para morar na roça, em Duas Barras. Casamos inclusive na fazenda lá. Eu sou 32 anos mais velho - vou fazer 68 anos no dia 12 de fevereiro - mas ela é mais antiga do que eu, é mais formal. É ela quem administra o Instituto Cultural Martinho da Vila.

Ziraldo - Quantos discos você tem?

Martinho - São 36. Um por ano. Dei muita sorte na vida de estar em contato com coisas como Donga e João da Baiana... Tive contato com a esquerda brasileira no período certo. Tive contato com a África no seu momento revolucionário. Assim vieram Batuque na cozinha, depois o canto das lavadeiras com Madalena...

Dermeval - Quizomba, com Vila Isabel, em 88, foi um momento importante na sua vida. Depois do Salgueiro com Zumbi dos Palmares, só Kizomba teve tamanha repercussão como carnaval de negritude.

Martinho - Quando a Vila Isabel foi para o primeiro grupo, o presidente me chamou para reforçar a escola. Kizomba eu fiz o enredo. O samba é de Luis Carlos da Vila. Oito sambas-enredos meus já foram para a avenida. Hoje sou presidente de honra da Vila Isabel, o que costuma criar choques com o presidente administrativo, por isso dei uma afastada. Também não faço mais samba-enredo, hoje é outra fórmula, tem grupos de dez fazendo sambas, o mesmo compositor faz para cinco ou seis escolas.

Poerner - Que nem jogador de futebol beijando tudo quanto é camisa.

Martinho - Neste carnaval o novo presidente, o carnavalesco e o diretor de carnaval chegaram: ''Martinho, queriamos uma idéia sua para enredo''. ''Agora não, antes eu fazia os enredos porque a escola estava numa situação difícil''. ''Mas podemos fazer enredo sobre esse seu disco novo, Brasil latinidade, é um momento bom para isso''. ''Tá, mas eu não quero ser autor'' Fizeram então o enredo Sou louco por ti América e voltaram pedindo para eu fazer o samba-enredo. ''Já disse que eu não ia fazer''. ''Mas você podia fazer então um samba, não para concorrer, mas que servisse como base para a escolha''. Peguei Luís Carlos e fizemos o samba, com uma melodia dolente, sem ser esse oba-oba que rola agora. Aí vieram: ''Martinho, podemos botar o samba na quadra''? ''Olha, eu não vou defender o samba, não gosto dessa forma de disputa''. ''Deixa com a gente!'' Mas aí acabou que cortaram o samba. Quando viram que não iam usar o samba que me pediram deviam pelo menos ter me avisado! É que nem eu encomendar um desenho a você, Ziraldo, não usar e nem falar nada! Agora parei mesmo com eles...

Poerner - Como você entrou na literatura?

Martinho - Também foi por acaso. A Editora Global criou a série de livros juvenis Quem canta conta e chamaram artistas como Rita Lee, João Bosco e eu. Fiz Vamos brincar de política?, onde crianças numa fazenda, sem os pais, tinham que se organizar. Depois, em 88, escrevi um livro sobre o Kizomba, para que aquilo ficasse registrado. Quem fez a pesquisa comigo foi a jornalista Dulce Alves. Aí peguei o gosto e escrevi quatro livros de ficção. Quando gravei um disco chamado Lusofonia com músicas e artistas dos 18 países lusófonos, descobri que os brasileiros não sabem quase nada sobre esses países. Quais as diferenças entre Cabo Verde e Açores? Escrevi um livro sobre isso e para não ser só uma coisa didática criei o romance de um jornalista que viaja por esses países.
Ziraldo - Você escreveu um livro sobre a sua mãe, né? Também, depois de ter custado
tanto a sair da barra da saia dela!

Dermeval - Você falou muito na espontaneidade, disse que é intuitivo, não pensa nas coisas que faz, mas seus últimos projetos são muito ligados a movimentos culturais. Lusofonia veio num momento de discussão da língua portuguesa, com a atenção voltada aos países africanos. Latinidade vem num momento de valorização da América Latina.

Martinho - Meus discos dos últimos tempos realmente são pensados como projetos. Tem uma proposta. Pesquiso para fazer discos como aquele com a cultura de Pernambuco, ou aqueles baseados no folclore. Dos meus 36 discos, só uns dez tem samba mesmo.

Ricky - Qual é o projeto em que está pensando agora?

Martinho - Latinidade foi voltado para os países com idiomas de origem latina, incluindo o português, o espanhol, o francês, o italiano, até o romeno. Agora quero fazer um disco mais da América do Sul. Quero fazer um disco para os povos vizinhos.
Dermeval - São projetos sobre os quais você detém o controle. Como é que um músico brasileiro tem tanta independência para fazer esses trabalhos?
Martinho - As pessoas fazem as coisas pensando em si, na sua carreira individual, eu faço porque tenho que fazer. Meu primeiro disco aconteceu por acaso, eu nem sabia como era gravar um disco. No segundo disco eu já quis botar orquestra, ter arranjos, e quando este não vendeu tanto, a gravadora me cobrou uma volta ao cavaquinho e violão. Falei então que eu ia parar e voltar para o quartel. ''Não! Seu disco ainda é o mais vendido da companha!'' Ah... percebi então que se eu fosse firme ninguém se meteria no meu trabalho. (ri) Vim assim até hoje. Numa determinada fase saí da gravadora e passei a fazer meus discos com o Mazzola, que tem seu próprio selo.

Poerner - Com tanta coisa que você faz, ainda pode ser considerado um boêmio?

Martinho - Não sou mais. O boêmio não é quem bebe, é aquele cara que vive os bares. É um profissional. (ri)

Nelsinho - Tenho um colega em Portugal que o figueiredo dele bateu pino, ele deixou de beber, mas continuou a ser boêmio. Toma água tônica com limão, mas ainda é o último a sair dos bares. Com a vantagem de poder levar todo mundo em casa.

Martinho - Mas hoje estou mais sossegado... não acho tanta graça. Estou devagar... devagarinho... (ri novamente)

Poerner - Para terminar, fale do Brasil de hoje.

Martinho - O Brasil está vivendo uma de suas melhore fases.

Poerner - Enfim, um otimista!

Martinho - Os problemas de corrupção que estão aí à mostra sempre existiram e não vinham à baila. Não estou dizendo que tenha sido alguma ação do governo atual que tenha levado a isso. Foi o momento. Me lembro quando qualquer pessoa que tivesse alguma projeção não ia em cana. Há uma evolução. Em termos internacionais o Brasil está com força. A política externa brasileira é a melhor de todos os tempos.

Dermeval - E em termos culturais?

Martinho - Poderia ser bem melhor. Gilberto Gil é um bom político e é ótimo para o governo porque é carismático e abre portas. Gil é quase um relações-públicas do governo Lula. Acho legal ele estar lá, nunca tivemos um negro ministro, nem artista ministro, e isso já é alguma coisa. Tem horas em que não podemos bater de frente para não atrapalhar futuros avanços.

Ricky - Você não esteve no Ano do Brasil na França, né?

Martinho - Não, e fiz um disco cantando em francês, o Conexão Brasil-França, mostrando a influência francesa na formação brasileira. Minhas músicas chegam na França. Quando Madeleine Peyroux veio ao Brasil fez questão de ver meu show no Canecão. Aliás, ela teve uma atitude legal: onde ela vai se apresentar, deixa um percentual do cachê para uma instituição social, e quando soube do meu instituto doou US$ 6 mil. (ri) Beleza!

(Enviado por JB online)

1 comentário:

Anónimo disse...

REVOLUÇÃO QUILOMBOLIVARIANA !
Manifesto em solidariedade, liberdade e desenvolvimento dos povos afro-ameríndio latinos, no dia 01 de maio dia do trabalhador foi lançado o manifesto da Revolução Quilombolivariana fruto de inúmeras discussões que questionavam a situação dos negros, índios da América Latina, que apesar de estarmos no 3º milênio em pleno avanço tecnológico, o nosso coletivo se encontra a margem e marginalizados de todos de todos os benefícios da sociedade capitalista euro-americano, que em pese que esse grupo de países a pirâmide do topo da sociedade mundial e que ditam o que e certo e o que é errado, determinando as linhas de comportamento dos povos comandando pelo imperialismo norte-americano, que decide quem é do bem e quem do mal, quem é aliado e quem é inimigo, sendo que essas diretrizes da colonização do 3º Mundo, Ásia, África e em nosso caso América Latina, tendo como exemplo o nosso Brasil, que alias é uma força de expressão, pois quem nos domina é a elite associada a elite mundial, é de conhecimento que no Brasil que hoje nos temos mais de 30 bilionários, sendo que a alguns destes dessas fortunas foram formadas como um passe de mágica em menos de trinta anos, e até casos de em menos de 10 anos, sendo que algumas dessas fortunas vieram do tempo da escravidão, e outras pessoas que fugidas do nazismo que vieram para cá sem nada, e hoje são donos deste país, ocupando posições estratégicas na sociedade civil e pública, tomando para si todos os canais de comunicação uma das mais perversas mediáticas do Mundo. A exclusão dos negros e a usurpação das terras indígenas criou-se mais e 100 milhões de brasileiros sendo estes afro-ameríndio descendentes vivendo num patamar de escravidão, vivendo no desemprego e no subemprego com um dos piores salários mínimos do Mundo, e milhões vivendo abaixo da linha de pobreza, sendo as maiores vitimas da violência social, o sucateamento da saúde publica e o péssimo sistema de ensino, onde milhões de alunos tem dificuldades de uma simples soma ou leitura, dando argumentos demagógicos de sustentação a vários políticos que o problema do Brasil e a educação, sendo que na realidade o problema do Brasil são as péssimas condições de vida das dezenas de milhões dos excluídos e alienados pelo sistema capitalista oligárquico que faz da elite do Brasil tão poderosas quantos as do 1º Mundo. É inadmissível o salário dos professores, dos assistentes de saúde, até mesmo da policia e os trabalhadores de uma forma geral, vemos o surrealismo de dezenas de salários pagos pelos sistemas de televisão Globo, SBT e outros aos seus artistas, jornalistas, apresentadores e diretores e etc.
Manifesto da Revolução Quilombolivariana vem ocupar os nossos direito e anseios com os movimentos negros afro-ameríndios e simpatizantes para a grande tomada da conscientização que este país e os países irmãos não podem mais viver no inferno, sustentando o paraíso da elite dominante este manifesto Quilombolivariano é a unificação e redenção dos ideais do grande líder Zumbi do Quilombo dos Palmares a 1º Republica feita por negros e índios iguais, sentimento este do grande líder libertador e construí dor Simon Bolívar que em sua luta de liberdade e justiça das Américas se tornou um mártir vivo dentro desses ideais e princípios vamos lutar pelos nossos direitos e resgatar a história do nossos heróis mártires como Che Guevara, o Gigante Oswaldão líder da Guerrilha do Araguaia. São dezenas de histórias que o Imperialismo e Ditadura esconderam.Há mais de 160 anos houve o Massacre de Porongos os lanceiros negros da Farroupilha o que aconteceu com as mulheres da praça de 1º de maio? O que aconteceu com diversos povos indígenas da nossa América Latina, o que aconteceu com tantos homens e mulheres que foram martirizados, por desejarem liberdade e justiça? Existem muitas barreiras uma ocultas e outras declaradamente que nos excluem dos conhecimentos gerais infelizmente o negro brasileiro não conhece a riqueza cultural social de um irmão Colombiano, Uruguaio, Argentina,Boliviana, Peruana,Venezuelano, Argentino, Porto-Riquenho ou Cubano. Há uma presença física e espiritual em nossa história os mesmos que nos cerceiam de nossos valores são os mesmos que atacam os estadistas Hugo Chávez e Evo Morales Ayma , não admitem que esses lideres de origem nativa e afro-descendente busquem e tomem a autonomia para seus iguais, são esses mesmos que no discriminam e que nos oprime de nossa liberdade de nossas expressões que não seculares, e sim milenares. Neste 1º de maio de diversas capitais e centenas de cidades e milhares de pessoas em sua maioria jovem afro-ameríndio descendente e simpatizante leram o manifesto Revolução Quilombolivariana e bradaram Viva a,Viva Simon Bolívar Viva Zumbi, Viva Che, Viva Martin Luther King, Viva Oswaldão, Viva Mandela, Viva Chávez, Viva Evo Ayma,Rafael Correa, Fernado Lugo,
Viva a União dos Povos Latinos afro-ameríndios, Viva 1º de maio, Viva os Trabalhadoras dos Brasil e de todos os povos irmanados.Movimento Revolucionário Socialista QUILOMBOLIVARIANO
http://vivachavezviva.blogspot.com/
quilombonnq@bol.com.br
Organização Negra Nacional Quilombo
O.N.N.Q. Brasil fundação 20/11/1970
por Antonio Jesus Silva