Dina Neiva e a sua Exposição nas Galerias João Abel Manta
«Pinto a mulher, porque o sou»
Desde o passado sábado e até ao próximo dia 17, está patente ao público, nas Galerias João Abel Manta, na cidade de Gouveia, a Exposição de Pintura ‘Ah Mulher!’, da autoria de Dina Neiva.
Natural de Ovar, onde nasceu a 8 de Abril de 1967, no seio de uma família ligada às artes e à escrita, Dina Neiva falou ao «Notícias de Gouveia» sobre a decisão de trocar Lisboa - onde viveu cerca de vinte anos - pelo Arcozelo, onde actualmente reside,e sobre o seu percurso artístico que conheceu diversas fases ao longo dos tempos e que se estende também à literatura.
Sócia-gerente de uma empresa de tecnologias, Dina Neiva tem na mulher o tema central da sua pintura, “pela graciosidade e encanto das suas formas, pelo seu ventre que gera vida, é um exemplo de força e de garra, transforma dores em esperança”.
Entre as Exposições realizadas, destacam-se as seguintes: Exposição colectiva de Pintura/Desenho na Cooperativa Sem Margem - 1981; Exposição de Pintura/Desenho na Casa do Povo de Ovar - 1981; Exposição de Pintura/Desenho no Casino de Espinho - 1982; Exposição Colectiva de pintura na Cooperativa Árvore - 1983; Exposição Colectiva de pintura na Cooperativa Árvore - 1984; Exposição de Pintura na Cooperativa Sem Margem - 1984; Exposição de Pintura no Diamante Club - 1985; Exposição de Pintura no Museu de Ovar - 1993.
Treze anos depois da sua última mostra, Dina Neiva volta a expor, agora em Gouveia. O NG aproveitou a oportunidade para saber mais sobre o universo pessoal e artístico desta mulher que é também mãe de quatro filhos.
Notícias de Gouveia (N.G.) - Não sendo natural desta região e tendo vivido quase vinte anos em Lisboa, como é que se deu a sua vinda para esta região, e mais concretamente para Arcozelo da Serra?
Dina Neiva (D.N.) - O meu marido, tinha cá a sua família e todos os anos vínhamos cá de férias, várias vezes por ano. Desde o início que simpatizei com o Arcozelo e com Gouveia e tinha um velho sonho, que era o de viver perto da neve. É evidente que não foi isso que nos fez decidir vir viver para cá, mas outras condicionantes que na altura foram importantes para esta mudança. Apesar de ter ido cedo para Lisboa estudar engenharia, nunca morri de amores pela capital.
Nos últimos anos Lisboa está demasiadamente delinquente, cheia de crime e com um stress que nos faz deixar passar a vida sem dar conta que ela passa por nós. Faz ideia de quantas horas andava diariamente no trânsito? Três horas, que ao fim de um ano dá cerca de 1000 horas. São essas mesmas horas que desperdiçamos em termos de vida.
Foi este conjunto de situações que nos fez pensar em mudar de cidade para se viver. Um local mais calmo dava-nos a permissão ter mais tempo para os nossos filhos, poder dar-lhes uma educação completamente diferente, termos mais tempo para nós próprios e investirmos mais num conjunto de situações que numa grande cidade não é possível.
Um dia sentamo-nos, falamos sobre o assunto e pusemos várias hipóteses em cima da mesa, uma delas era vir para o Arcozelo da Serra, e foi essa a hipótese que acabou por vencer. E hoje cá estamos, felizes com a nossa decisão, cá já tive mais um filho, o que em Lisboa seria inconcebível, quer em termos de tempo, quer monetários, pois numa cidade grande educar quatro filhos é muito complicado.
N.G. - Como é que a pintura surgiu na sua vida?
D.N. - Nasci no seio de uma família ligada às artes e à escrita, e desde cedo revelei interesse pelas artes pelo que ao longo da juventude fui experimentando diferentes formas de expressão artística, divididas entre a pintura, o desenho e a escrita.
Em 1980 iniciei a minha carreira artística como auto didacta, elaborando os meus primeiros trabalhos em carvão e a lápis. Mas é em 1982 que começo a frequentar o atelier do pintor e Mestre António Rosa e começo a desenvolver outras técnicas, tais como a pintura em tela, aguarela e olaria. Em 1983 apesar de continuar a frequentar o Liceu Júlio Dinis em Ovar, em paralelo frequento um curso de 3 anos de belas artes na Cooperativa Árvore no Porto. Terminado o Liceu e o curso de belas artes opto por enveredar numa carreira de engenharia e parto para Lisboa onde tive a oportunidade de contactar com gentes dos mais diversos meios artísticos. Nessa altura começo a dedicar mais tempo aos meus estudos e a escrever com alguma frequência poesia e prosa. Não tendo deixado a pintura para trás, passo a pintar esporadicamente, umas vezes por necessidade interior, outras para oferecer a amigos, dedicando-me apenas à minha carreira profissional na área da Engenharia Informática. Tal qual como faço actualmente, na maioria do meu tempo, já que sou sócia-gerente de uma empresa de informática na Guarda.
Hoje passados, 26 anos do início da minha carreira e 13 da última exposição, de há um ano para cá, voltei a pintar diariamente, como uma necessidade intransigente da alma, dando-lhe a paz interior que tanto necessito.
N.G. - Como define, ou de que forma é que caracteriza, as suas obras?
D.N. - A maioria dos pintores vê uma mesa e pinta a mesa, vai à natureza e pinta a natureza. Pinta casinhas e retratos. Eu não sei e não quero fazer isso. Eu vejo a tela em branco o tema e a partir daí começo a pintar. É verdade que como tema central, gosto especialmente de pintar a mulher, pela sua graciosidade e encanto das suas formas, pelo seu ventre que gera vida, pelo exemplo de força e de garra, da forma como transforma dores em esperança. Pinto a mulher, porque o sou, e como tal é o ser que melhor conheço mesmo sem ter que me olhar no espelho. A mulher é um ser lutador que consegue ultrapassar todas as adversidades. É esse ser que é obra da natureza e há que a enaltecer, recuperar os valores femininos, pintar sua a polaridade. É à mulher que dedico os meus textos, os meus versos, os meus seus sonhos e as minhas obras. Sim, porque a mulher é uma eterna sonhadora, romântica, feminina, que sabe muito bem o seu papel na vida, como companheira, guerreira, doce, cheirosa, harmoniosa, e também decidida, atrevida, voraz, objectiva, cheia de vida, como eu me considero.
N.G. - A vivência na Serra da estrela e em particular em Arcozelo da Serra têm influenciado a sua produção artística?
D.N. - Se eu tivesse ficado em Lisboa acho que não pintaria desta forma, por falta de tempo e pelo stress que aquela cidade emana. O estado de espírito de uma pessoa, assim como as cores que se usa num quadro, tem a ver com o lugar em que se vive, e aí sim o Arcozelo influenciou as minhas obras de uma forma muito especial. Eu pinto sempre à noite, pois é mais calmo, mais sossegado, com um pouco de musica estou no meu pequeno atelier sem algo que me possa incomodar. Na realidade este foi o lugar onde mais pintei com a alma e me senti feliz porque também tenho mais tempo para a reflexão.
N.G. - Há algum pintor que tenha como referência ou cujo trabalho admire particularmente?
D.N. - Frida Kahlo e Pablo Picasso. Frida Kahlo foi uma artista única, uma revolucionária também, mexicana, que para muitos é considerada a pintora do século. Apesar de seu pouco tempo de vida, deixou-nos obras magníficas e intrigantes. A sua vida foi marcada por grandes tragédias e isso deu-lhe o impulso para pintar as suas angústias, as suas vivências, seus medos. Para mim foi uma pintora e uma mulher fantástica.
Pablo Picasso foi para mim o mais versátil artista do século 20. Picasso, juntamente com o pintor francês Georges Braque, criou o Cubismo, uma forma de expressão artística que eu adoro. Graças ao Cubismo, a liberdade do artista estendeu-se também aos materiais, os meios tradicionais como a pintura e a escultura puderam ser substituídos por objectos colados nas telas, ou ‘montagens’ de itens construídos ou ‘achados’. Ao contrário do que muita gente pensa, Picasso nunca chegou a criar uma arte puramente abstracta. O que de facto mostra a sua versatilidade em relação aos seus contemporâneos.
N.G. - Uma última questão: que expectativas tem em relação a esta Exposição em Gouveia?
D.N. - Espero que as pessoas apreciem a minha obra seja ela de uma forma positiva ou negativa. O artista cria e o público recria a obra, espero por isso obter críticas construtivas que me façam crescer na minha carreira e me impulsionem para novas criações. Esta exposição não tem como objecto central a comercialização, mas sim mostrar as minhas motivações, as minhas emoções e impulsos interiores e a minha forma de estar perante a vida.
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