Os nomes que vão passar pelo FESTA deste ano nunca saberão que ali ao lado, decrépito, está um ícone da cultura vareira que já agonizou o que havia para agonizar.
Provavelmente, do palco de onde vão actuar só terão um vislumbre das traseiras esventradas do antigo e imponente Cine-Teatro de Ovar e da sua arquitectura. Um imóvel com uma superfície coberta de 1.400 metros quadrados e logradouro de 511 metros quadrados, localizado no coração da cidade.
Inaugurado a 30 de dezembro de 1944, estávamos perante uma sala de espetáculos para cerca de 1000 espectadores e um Salão de Festas que marcou uma época do Carnaval ovarense.
Em face do papel que desempenhou na formação cultural de várias gerações, nunca é demais falar-se de uma certa impotência revelada em salvar o imóvel, tendo sido adquirido e logo depois abandonado pela autarquia que descartou dar-lhe o papel de outrora uma vez que foram tomadas opções alternativas para ocupar a missão que lhe esteve confiada durante gerações.
Falamos do Centro de Artes de Ovar, inaugurado a 25 de julho de 2009, com capacidade para 340 pessoas.
construída na década de 40, pode vir a facilitar uma qualquer remoção deste património urbanístico, que segundo um texto de António Dias Fernandes no jornal “João Semana” (15/06/1983), a sua edificação resultou numa história que, “pelas suas circunstâncias, podemos considerar lamentável”. Uma referência a uma época em que era pároco de Ovar o Padre Boaventura Valente de Matos a quem terá sido garantido que obra para o Cine-Teatro, “seria uma construção relativamente baixa, que não «assombraria» a Igreja”. Mas, “em fins de 1943 a obra tinha tomado proporções que contrariavam ostensivamente a promessa feita ao Padre Boaventura”.
Esta polémica acabou por chegar ao Bispo do Porto, D. Agostinho de Jesus e Sousa, através de uma exposição em que “se pediam providências”. Curiosamente “a consequência imediata foi a nomeação do Padre Boaventura, em fevereiro de 1944, para a freguesia de Maceda, decisão esta que ele não acatou, preferindo ser colocado como professor no Liceu Alexandre Herculano, no Porto”. Para a freguesia de Ovar viria então a ser nomeado pelo Bispo do Porto, o Padre Crispim Gomes Leite. Cuja “primeira preocupação foi mostrar a inconveniência da construção do Cinema naquele local, conseguindo embargar as obras.
No entanto, a Sociedade empenhada no empreendimento também não cruzou os braços, procurando solucionar o problema a seu contento”. Ainda foram contactados o Bispo de Vila Real, D. António Valente da Fonseca, e o Cónego Dr. Manuel Valente, naturais de Válega, que com D. Agostinho, de quem queriam ouvir opinião, “fizeram com ele de imediato, uma visita ao local, concluindo ser já tarde demais para travar a obra. Ela tinha já atingido tais dimensões que, no seu entender, era inaceitável qualquer ideia de retrocesso. E até porque, concluíram, «a Igreja não pode impedir o progresso”.
Assim os seus proprietários se decidam sobre o que fazer, uma vez que o tempo em que este edifício, a exemplo de outros municípios, podia ser transformado e valorizado como um moderno Centro de Artes, acabou em nome de opções politicas na gestão socialista, por ser abandonado, ainda que já na altura tenham pesado os considerados elevados custos na aquisição do imóvel que, curiosamente, não foi reivindicado como de interesse público.
Passados todos estes anos de esquecimento é sempre encorajador ver aparecerem cidadãos no facebook a reclamar: “Vamos pedir encarecidamente aos responsáveis pela cultura na nossa terra, que façam um esforço no sentido desta riqueza ficar de pé, recuperada e entregue ao povo de Ovar, pois daria certamente um bom centro cultural… poderia ser até uma escola de artes, ballet, música, teatro, etc… É um verdadeiro desperdício e uma enorme perda para o nosso concelho. Acredito que ainda é possível recuperar este edifício que tem tanta história no nosso concelho”. Assim termina uma voz inconformista com o estado a que o velhinho chegou, transformado que está num pombal com telhado a ruir e natural infiltração das águas da chuva.
https://www.ovarnews.pt/?p=63750
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