quinta-feira, novembro 30, 2006

Este está a pedi-las, está, está...
Todo Carnaval tem seu fim

O que leva alguém a querer mascarar-se durante três dias, quando passa os restantes 362 a tentar ser qualquer coisa que não é?

Todo o Carnaval tem seu fim. Menos o português.
Há crise? Não gosto. «Prontos». É assim tipo favas ou o rali Dakar. Não gosto, embirro. E não é do tipo «nunca experimentaste...». Já experimentei provar favas, de receitas diferentes, e o resultado foi o mesmo: uma instalação moderna desastrosa que cabe entre as designações «vómito» e «gregório». Já experimentei tentar gostar do Dakar, mas de facto não consigo encontrar piada nenhuma numa prova que tem milhares de quilómetros em terra, dunas e calhau, correm uns rapazes e umas raparigas com carros, motos e camiões que de parecido com veículos do dia-a-dia têm, 'praí, o facto de lhe chamarmos «carros, motos e camiões», e que normalmente é ganho pelo rapazito que tem o melhor protótipo e no qual gastou mais dinheiro. Porque o deserto é gigante, mas esta gente passa lá todos os anos e conhece as dunas de cor.


Também já tentei gostar do Carnaval. Até me lembro de ter ido a várias festas, quando era mais jovem, e de facto diverti-me bastante... mas porque a malta era do melhor e as festas tinham espírito de festa. Eu queria era estar na festa, pouco me importava se a malta andava vestida de freira ou proxeneta. E a verdade é que eu decidia «em que» me mascarar aí uns... dois minutos antes de ir para a festa. O resultado era deplorável, certo. Mas era apenas o bilhete de entrada. Uma vez na festa, podia voltar a ser eu.

O Carnaval do Brasil é bonito. Lá. No Brasil, é bonito. O Carnaval é uma instituição brasileira, independentemente de ser ou não uma desculpa para os brasileiros andarem cinco dias sem pensar que são pobres e não têm dinheiro para alimentar os filhos. É assim tipo sócio do Benfica depois de ganhar à Académica: é Carnaval, que se lixem as dores na carteira.

E por isso não entendo muito bem como é que alguém, um dia, se lembrou: «epá, que grande ideia, vamos fazer isto também em Portugal. Somos ricos em sonhos, pobres em ouro, mas não nos importa, vamos fazer um Carnaval tão bom ou melhor que o do Brasil». Não sei quem foi, mas espero que lhe tenha dado uma diarreia dolorosa. A ideia, gloriosa desde a génese, fazia coincidir a data com o Carnaval do Brasil. E então o Carnaval seriam três dias maravilhosos, cheios de sol, calor, corpos despidos e suados, alegria, folia, tudo o que tipicamente existe em Portugal no mês de Fevereiro.

Afinal o que passa pela cabeça daquela gente que se aglomera no Carnaval de Ovar enquanto espera pela passagem dos Zés-Pereiras? Depois aparece sempre uma senhora muito contente a falar para a TVI. Diz ela «isto é uma grande 'divertição'! Estou mascarada de 'abdominável' homem das neves!», enquanto os joelhos tilintam um no outro com os 3 graus que se fazem sentir e a chuva lhe bate com insistência nas ventas.

Mas porque é que não deixaram o Carnaval sossegadinho lá no Brasil? Já viram algum brasileiro levar os Santos Populares para lá? Olha agora em Junho, nas chuvas torrenciais do Rio de Janeiro, de um lado as barraquinhas com manjericos, sardinha assada a sair da grelha e tintol do mais carrascão que há; do outro, martelinhos de São João e pelos altifalantes, em vez do «cidadjiiiii, márávilhósaaaaa, cheiáááá djincantus-miiiuuu...», soa «um craveiro numa água-furtada, cheira bem... PUM-PUM... cheirá-Lisboa». Acham mesmo que os brasileiros lhe ligavam alguma? E que vestiam saia rodada e colete preto??(«Todo-Carnaval»)

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