Há muito que venho alertando, em conferências e por escritos, que os problemas de defesa da costa arenosa não se resolvem com a construção de muralhas de pedra nas frentes litorais. Infelizmente estou só (ou quase) nesta convicção, incómoda, aliás, para quem tem procurado vincular uma posição contrária, não por evidências justificativas, mas apenas por aquela atitude de “não querer dar o braço a torcer” aceitando, ponderando e explorando as ideias de outros que, inequivocamente nunca se sentiram na obrigação de ir a reboque de qualquer espécie de doutrinação clubista.
Na verdade, para entender o que se passa na costa não basta um simples olhar para a praia a desaparecer rapidamente e para as vagas a levarem os bens materiais. É preciso sobretudo compreender aquilo que não se vê, aquilo que se passa no mundo escondido da água próxima da costa e num plano pouco perceptível do areal da praia. Foi movido por esta ideia que há oito anos escrevi o livro “Quando o mar enrola na areia”, em linguagem de fácil entendimento e onde procurava divulgar os fenómenos responsáveis pela erosão das praias.
É lamentável, pois, que aqueles que se dizem gestores do bem público local, não tenham absorvido tais conhecimentos (ou pelo menos procurado confrontá-los), pois por certo teriam assumido posturas bem diferentes desde então.
Acontece que, infelizmente, os processos da dinâmica marinha têm sido os principais justificadores das ideias que tenho vindo a propagar acerca da erosão costeira. Veja-se o que aconteceu nos últimos meses na costa de Ovar aquando da ocorrência de marés-vivas! Segundo os teóricos (se é que ainda os há!) da defesa costeira mediante campos de esporões, a zona frontal do Furadouro seria à partida a zona melhor defendida de toda a praia. Contudo, não o foi!
Desde que foi decidido avançar com o projecto de melhoramento e reforço das defesas costeiras em Esmoriz, em Cortegaça e no Furadouro que estas investidas do mar eram por mim esperadas. Há quatro anos procurei alertar no meu livro “A praia dos Tubarões” para o erro perigoso deste tipo de intervenções. Os principais destinatários da mensagem mais uma vez a procuraram ignorar, e mais uma vez o oceano os apelidou de inconscientes. Em toda a frente costeira do concelho, desde Cortegaça ao Torrão do Lameiro, o mar produziu no primeiro Inverno após o início das obras, taxas de recuo muito superiores aquelas que vinham sendo experimentadas até então. E o pior, é que nos próximos Invernos a situação tenderá a agravar ainda mais, estando definitivamente a praia do Furadouro colocada numa situação de ameaça crescente aquando de situações de temporal ou de marés-vivas.
Caso continue a manifestar-se, a nível nacional, ausência de uma política consistente para o litoral arenoso, a tendência dos “gestores nacionais da costa” será para dar continuidade à política dos calhaus, sobretudo quando esta é reivindicada pelos “gestores locais”. Assim sendo, não demorará muito que, entre outros sectores, a zona frontal do Furadouro será destituída do seu areal, tal como acontece a sotamar do esporão sul; porque este espaço será provavelmente ocupado com o aumento significativo do actual enrocamento aí existente. A ver vamos!
Este é e continuará a ser o saldo de mais uma intervenção estouvada, que em nome da defesa costeira, simplesmente agravou ainda mais o estado das praias do concelho. Este é, também, o saldo de quem sempre optou por “daqui lavar as mãos”, colocando a resolução dos mesmos unicamente nas intervenções do Governo Central. Este é o saldo de quem nunca olhou para a capacidade e vontade de outros pares, que de mentes abertas são capazes de acolher, de pensar e de arranjar alternativas, ensaiando estratégias ambientalmente mais sustentáveis nos seus territórios litorais concelhios.
Álvaro Reis in «Ondas e Ventania»
1 comentário:
Gostava de saber quais seriam as melhores soluções, para resolução desse problema, a fim de as poder-mos ou não apoiar.
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